Estreias da Semana
Data
29 October 2014

Gotham (Ep. 1 – 5) – 1ª Temporada

Gotham, a série, propõe-se a contar a história de Gotham, a cidade, antes de esta ser habitada por vilões, heróis, morcegos e baralhos de cartas. O objetivo é dar a conhecer ao espectador o que tem esta cidade de diferente – em vários filmes já foi dado a conhecer o quanto Gotham é sombria, ameaçadora e sem misericórdia, mas será que foi sempre assim? Ou foi através de um ciclo de heróis e vilões, assassínios e corrupção? E nunca houve qualquer esperança, ou houve quem resistisse a esta espiral descendente? São todas estas perguntas e muitas outras possíveis que levaram à produção de Gotham.

A história desta Gotham, diferente de todas as outras vistas até agora, centra-se em James Gordon (Bem McKenzie), o futuro comissário da polícia, agora um recém-promovido detetive, acabado de chegar a esta nova etapa da sua vida, ele mesmo, como o espectador, um desconhecido de Gotham a tentar perceber como funciona este sítio em que tudo parece encoberto por sombras e segundas intenções. O seu parceiro é Harvey Bullock (Donal Logue), um veterano na força policial que conhece a cidade tão bem como as suas próprias mãos. A relação destas duas personagens é explorada frequentemente – por um lado trabalham juntos diáriamente na tentativa de resolver ou evitar atividades criminosas, por outro lado são o oposto moral um do outro: onde Gordon segue o protocolo e a lei, Harvey prefere não interromper o seu almoço por causa de um assalto do outro lado da rua.

O primeiro caso deste duo é o homicídio de Martha e Thomas Wayne e neste primeiro episódio são estabelecidos grande parte dos alicerces para compreender este ecossistema. O espectador fica a conhecer um jovem Bruce Wayne, e Gordon estabelece uma relação peculiar com Bruce que promete ser, no mínimo, original, tendo em conta que em outras histórias pré-Batman é raro haver mais do que um ou dois contactos furtuitos entre Bruce e Gordon, sendo que o núcleo da relação entre estas personagens se costuma centrar no contacto entre o alter-ego de Bruce e Gordon como comissário da polícia, através do desejo mútuo de manter Gotham acima da linha de água do caos e da loucura. Nesta série todos estes elementos começam a surgir muito mais cedo, como se a preparação de Bruce começasse com a morte dos seus pais. Muitas outras personagens conhecidas da banda-desenhada são apresentadas ao longo dos episódios, sendo os mais visíveis: uma jovem Catwoman, um Riddler que é um assistente de laboratório da polícia e Oswald Cobblepot (o Pinguim). O primeiro episódio não perde tempo a definir o nível de corrupção que habita em Gotham, a influência de grandes líderes de máfia do submundo como Don Falcone e os seus lacaios e a inabilidade ou falta de vontade e poder das autoridades para combaterem esta tendência. Algo original nesta série é o nível a que elevam os testes morais que são impostos a James Gordon. Desde o primeiro episódio que este é forçado a fazer escolhas quase impossíveis, obrigando-o a caminhar num trajeto de tons cinzentos que nunca foi característico desta personagem. No entanto, o facto de ser apresentado ao espectador muito mais novo do que provavelmente em qualquer outra narrativa, apela a um caminho mais tortuoso e menos rígido à medida que a própria personagem se desenvolve. O facto de também ser aberta uma porta para a vida pessoal de Gordon torna-o ainda mais central, deslocando-o do seu papel de polícia para registo mais pessoal de quem não lida só com o mal e o bem, mas também com os seus sentimentos e com os sentimentos de quem lhe é próximo. Outra figura que tem sido central e cuja evolução é extremamente visível ao longo dos cinco episódios é Oswald Cobblepot. Não só Robin Lord Taylor está a fazer um trabalho excelente a dar vida à personagem, como é um vilão realmente diferente, mais motivado pelo amor a Gotham e pela vontade de triunfar na sua cidade a que chama casa, do que por raiva, vingança ou interesses psicopáticos.

Cada episódio acrescenta um pouco mais à história de Gotham, como se conduzisse o espectador à Gotham do futuro que é conhecida no universo Batman. Quer seja pela referência a um vilão conhecido, ou pelo surgimento de vigilantes entre a população e a forma como isso afeta Bruce ou pela inauguração do projeto do Asilo de Arkham, tudo são peças que se vão juntando e contribuindo para um panorama conhecido – o interesse reside em ver como se vai lá chegar. Neste sentido é discutível o ritmo a que a série vai progredir daqui para a frente. Até aqui tem sido abundantemente generosa em pistas e pequenos elementos que os fãs de longa data rapidamente reconhecem, funcionando na perfeição como forma de criar uma relação espectador-produto, no entanto, a continuar a este ritmo, terá de ser introduzido muito material desnecessário ou inventar material de todo novo, caso contrário daqui a 20 episódios Bruce Wayne está psicologicamente pronto para usar uma capa e fazer uma voz grave. A gestão da introdução de mitologia icónica e do desenvolvimento das personagens terá de ser balanceada quase na perfeição se o objetivo for uma série que se estende por várias temporadas com qualidade elevada. Uma alternativa possível seria o recurso a temporadas com menos episódios – historicamente a qualidade deste tipo de séries tem sido mais elevada, muitos alegam que a primeira temporada de The Walking Dead foi a melhor, com os seus 6 episódios, e Spartacus não teve nenhuma temporada com mais de 13 episódios. É discutível a necessidade de temporadas com mais de 20 episódios e até que ponto não se estará a espremer uma fórmula que resulta em vez de haver um esforço para manter o produto com qualidade e fiel a si mesmo.

 Assim sendo, Gotham consegue transmitir um ambiente único de uma cidade que tem tanto de ameaçador como de potencial e o feito de serem exploradas novas facetas das personagens mantendo-as ainda assim reconhecíveis para fãs anteriores à série é de louvar. Os 5 primeiros episódios forneceram uma boa introdução a este mundo, resta saber como irá evoluir daqui para a frente, sem esquecer que muito pode ser feito para estragar o que foi bem conseguido até aqui.

P.S.: Gotham tem o mordomo – Alfred Pennyworth com mais personalidade até ao momento. Não desfazendo a interpretação de Michael Caine na trilogia Nolan, mas Sean Pertwee traz a lufada de ar fresco à personagem que ninguém sabia que precisava.

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