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Os Filmes da Minha Vida – Amor ou Consequência (Jeux d’enfants, 2003)

Os filmes da minha vida não são os melhores filmes que vi; longe disso. É importante perceber que aquilo que nos marca, atinge-nos tendo em conta contextos muito específicos, com muito de emocional ligado.

A ideia de nos ligarmos a um filme emocionalmente tem que ver com a relação que este estabelece com os nossos valores. Há muito pouco de crítico e imparcial na forma como adoro religiosamente os “meus” filmes. Sim, “meus”, porque estas obras acabam por fazer parte de nós.

E aqui chegamos a Jeux d’enfants, um filme que insisto em pronunciar mal, e que em Português adotou o título de Amor ou Consequência. Curiosamente, e excecionalmente, esta tradução faz mais jus à obra, que o seu título original.

Em primeiro lugar importa dizer que facilmente esta obra poderia adotar o nome dos seus atores protagonistas: Marion Cotillard e Guillaume Canet. Isto porque a história deles não terminou aqui, sendo que a química incrível vivida, transpôs a 7ª arte, tornando-os num dos casais mais reconhecidos pelo público francês.

Contextualizando a história; Sophie e Julien são duas crianças de classes socioeconómicas diferentes: Sophie é uma polaca de segunda geração que vive em ambiente precário, enquanto Julien pertence à classe média.

Quando a mãe moribunda de Julien decide dar-lhe uma misteriosa caixa, (quase) todas as convenções de um filme romântico se alteram. A caixa serve de pretexto para que Sophie e Julien entrem num jogo de “crianças” em que em troca da caixa, cada um deles terá de aceitar um desafio. Rapidamente avançamos 10 anos, mas o jogo contínua, cada vez mais psicótico.

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Sim, a forma como o amor deles evoluí é, no mínimo, pouco saudável. No entanto, paixão e saúde não nascem associadas naturalmente.

É ao afastarem-se em nome dos padrões morais da sociedade (papéis de género, pressão para casar, ter filhos, um emprego certo) que a vida deles entra numa profunda monotonia.

Assim, a questão levanta-se: Adaptação e comodismo, ou monotonia são realidades necessariamente sine qua non?

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Stéphane Mallarmé disse um dia que “definir é matar”; então porquê a necessidade de definir “vida”, ou definir “amor”. Porquê definir?

Amor ou Consequência é uma ode à psicose egoísta e necessária para quem, mais que a vida, que sentir. A dormência imposta por convenções é aqui posta em causa, tornando-se mais fácil de aceitar por ser em nome do amor – e por ser a Marion Cotillard a maluca de serviço.

No entanto, o sentimento é só um disfarce para a mensagem. Aqui o “Je t´aime” é circunstancial. Não são as palavras que nos mostram a relação do duo protagonista, são os gritos e o que se diz por trás dos diálogos.

Sim, algumas partes roçam a lamechice típica do género, com um melo-dramatismo por vezes excessivo. No entanto, tudo se torna secundário quando a obra atinge o seu propósito: tocar-nos.

No fim, frases como “eu amo-te Marion Cotillard”, ressoam compulsivamente na minha cabeça. “Deixa-me desposar-te Marion”, é outra das que marca o meu espírito a cada visionamento desta “brincadeira de crianças” que deveria ser levada a sério por todos nós.

Por vezes esquecemo-nos daquilo que queremos ser e focamo-nos em tentar parecer, o que é substancialmente limitativo e sensaborão. Em criança a nossa imaginação e criatividade é quase ilimitável. Amar deve ter muito mais piada se formos o Peter Pan…

 

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