Filmes da Minha Vida (João Peixoto) – Clube dos Poetas Mortos (Dead Poets Society, 1989)
Depois de diligenciar o meu tempo de luto, decidi voltar aos Clássicos Williams. Passei por The Fisher King, Deconstructing Harry, Jumanji, Good Will Hunting… No entanto, nenhum outro me atinge, tão intensamente, como Dead Poets Society!
Há certos filmes que se entranham na pele para nunca mais sair, que mudam a nossa vida, alterando subtilmente as nossas percepções da realidade, quase sempre para melhor. Este, para mim, é um desses.
Quando somos pequenos, são fortuitas as ocasiões em que paramos para pensar de onde vimos e para onde vamos. Simplesmente vivemos para aqueles dias, esperando que as notas sejam boas o suficiente, que acordemos cedo o suficiente ao fim de semana para apanhar o Disney Kids, e é isso. Nada mais.
Este filme teve a capacidade de me mostrar que temos a responsabilidade e a alegria de estarmos vivos neste planeta. Que somos pó, e vamos voltar a ele, por isso, no muito pouco tempo que temos, temos obrigação de fazer a diferença. Que temos a obrigação moral de “seize the day, and make our lives extraordinary“. Que as únicas limitações estão dentro de nós mesmos, e que nos devemos rebelar contra o conformismo, para mudar o que odiamos e manter o que amamos. Que a vida neste mundo é uma bela responsabilidade, e que só os covardes não se atrevem a mudá-la para melhor.
Então aqui estou eu, sentado, anos depois daquele dia em que vi pela primeira vez Dead Poets Society. Ainda acho que não aproveito o dia completamente, mas é uma tarefa hercúlea que continuo a perseguir.
Existem alguns filmes que, se os vemos na idade certa, têm a capacidade de nos inspirar e encorajar – títulos como Stand by Me, Billy Elliot e Forrest Gump… São supersinceros, idealistas e cheios de esperança, e o que, por vezes, falta em elogios da crítica tem recuperado em apreço público.
Dead Poets Society é frequentemente citado pelos telespectadores como um dos filmes mais inspiradores de todos os tempos.
Se removermos o verniz de privilégio de que gozam os rapazes em Welton, os paralelos entre as nossas vidas e a deles tornam-se mais evidentes. Neil Perry, Todd Anderson e os outros alunos sofreram constrangimentos que nos parecem muito familiares. Numa das primeiras cenas são lembrados dos quatro pilares que eram a base para uma educação em Welton: Tradição, Honra, Excelência e Disciplina. Estes mesmos tiveram um grande papel na minha formação familiar.
Felizmente, os meus pais não são tão duros como os de Neil Pery. No entanto, também eu senti a necessidade de recompensar quando me diziam que esperavam grandes coisas de mim e quando me apercebia dos sacríficos que faziam para ter a melhor educação possível.
Eu, como os estudantes em Dead Poets Society, senti-me sobrecarregado com a carga terrível de dever e obrigação. Talvez seja por isso que fui seduzido pela belíssima interpretação de John Keating (Robin Williams) – o professor pouco ortodoxo que aproveita o poder da literatura para abrir as mentes dos seus alunos. É através de Keating – personagem inspirada num professor do guionista Tom Schulman – que aprendemos a emergir sob a sombra da expectativa.
Este tema ressoou em mim; a batalha entre o idealismo e a obrigação é igualmente brutal para se lutar tanto num ambiente privilegiado nos Estados Unidos da América ou no desamparo duro de um bairro pobre do Bangladesh.
Ao contrário dos meus outros filmes favoritos – Annie Hall, Apocalypse Now, Nouvo Cinema Paradiso, Barry Lyndon , entre outros – este clássico com Robin Williams pareceu resistir a ser revisitado. Quando, recentemente, voltei a ele, ao lado da minha mãe, encontrei alguns aspectos, no filme, que não envelhecerem bem, mas continuou a bater-me violentamente.
Este não é um filme, em última instância, sobre a escola ou poesia: é sobre a morte. Na cena onde um rapaz se prepara para a escola, acima dele paira uma pintura de antigos alunos mortos. A morte literalmente olha para baixo. É a morte que fornece a força propulsora por trás de lições de John Keating.
“Gather ye rosebuds while ye may, Old Time is still a-flying: And this same flower that smiles to-day To-morrow will be dying” – Robert Herrick
Poesia e paixão, a comédia e a tragédia são fundidos numa afirmação absolutamente maravilhosa de espírito independente em Sociedade dos Poetas Mortos.
“No matter what anybody tells you, words and ideas can change the world” – John Keating
Anos depois de ser bombardeado com esta mensagem pelo meu pai, ouvia, pela boca de outrém, que era uma realidade. Um obrigado ao meu pai por me fazer lutar pelas coisas pequenas e por confiar nas palavras, e um obrigado a este filme por vir reforçar a ideia.
“Os filmes da minha vida não são os melhores filmes que vi” e não considero Dead Poets Society o Cristiano Ronaldo do cinema. No entanto foi ele que me incitou uma série de lições de vida importantes.