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O Meu Nome é Alice (Still Alice, 2014)

Estima-se que se toda população mundial tivesse uma esperança média de vida superior a 114 anos, então todos iriamos sofrer de Alzheimer. Esta realidade longínqua, e associada à velhice, tende facilmente a ser caricaturável no cinema. Cair no erro do overacting, da choradeira descompensada, cair na facilidade suportada por efeitos sonoros clichés, é um caminho recorrente. Ao invés, o sofrimento deve ser feito de contenção, de pausas, de silêncios. Se assim suceder, a sua representação sem exageros na 7ª arte, normalmente resulta num soco no estômago mais sublime, e isto nada tem que ver com a complexidade, ou qualidade do filme em si, prende-se com a ligação emocional que se cria com o espectador.

Em Still Alice, a história é tão simples e densa quanto as duas palavras que compõem o título da obra. O filme, baseado na obra ficcionada de Lisa Genova, tem tanto de simplicidade, quanto de complexidade. O balanço entre o choro abafado e o silêncio ensurdecedor é o que torna esta realidade tão desconhecida, como algo dolorosamente próximo. E, neste caso, 90% do mérito recai sobre Julianne Moore e a sua interpretação inadjetivável.

Alice (Julianne Moore) é uma renomada professora de linguística que vê o seu mundo desabar quando, aos 50 anos de idade, lhe é diagnosticado uma forma precoce de alzheimer. Da negação, à aceitação, do sério, ao leve; Julianne leva-nos com ela a deambular entre o tempo e o espaço, sem que nos apercebamos da dimensão temporal da obra. Um pouco como Alice, não sabemos onde estamos e para onde vamos. Somos sugados por uma realidade que é partida através da escala da dor e que, pelo facto de ser desdramatizada em partes, se torna ainda mais dramática. O aperto no coração, a falta de ar, o medo; tornamo-nos uma verdadeira esponja emocional, à medida que vemos a magistral deterioração mental de Alice.

Aliás, este ano temos dois casos paradigmáticos e antitéticos em Hollywood: por um lado Eddie Redmayne e a sua transformação física em Stephen Hawking, e aqui, Julianne Moore, que executa a transformação mais difícil, e que até ver só requer maquilhagem emocional, a mental. Enquanto em Teoria de Tudo vemos Eddie imitar as limitações de Hawking, em Still Alice, vemos o desespero de alguém que se vê privado daquilo que mais prezava: o seu intelecto.

Para além de Julianne, toda a obra é bem suportada pelos atores secundários. Alec Baldwin, o marido de Alice e Kristen Stewart (a filha) – que parece talhada para estes papéis – têm a humildade de deixarem resplandecer Julianne, brilhando individualmente a espaços. Todos estes papéis mais pequenos adicionam a outra perspetiva da doença; a perspetiva de quem em consciência vê alguém que ama sucumbir progressivamente, alguém que se sente impotente perante a irreversibilidade e inevitabilidade da fatalidade. Esta parte acabou por ser explorada apenas superficialmente, em prol da auto-experiência de Alice, ainda assim, e mais uma vez, sempre em contenção, sem recorrer a melodramatismos que só serviriam para adulterar e romancear uma realidade que se quer servida crua.

No final, difícil será avaliar quantitivamente este filme, pois Julianne Moore confunde-se com a obra em si, e por isso, todas as possíveis falhas ficam em segundo plano quando no final nos sentimos no rescaldo de uma catarse.

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