Looking (2014) – Balanço de Primeira Temporada

Looking, uma das mais recentes séries da HBO, é uma série sobre homossexuais, mas também sobre todos nós. Para ir direta ao assunto, Looking é uma eficaz lembrança da nossa própria vulgaridade. Uma lição de humildade. Uma notificação. Dois dedos que nos beliscam o ombro enquanto nos dizem: “Afinal não são assim tão diferentes uns dos outros”.

Dom (Murray Bartlett), na casa dos 40 e ainda sem uma carreira profissional em ascendência, sonha abrir um restaurante próprio que cozinhe especialmente Frango com Piri-Piri, o prato português que tenta desesperadamente dar a conhecer ao mundo. Augustin (Frankie J. Alvarez) continua em busca do seu lugar no meio artístico, oscilando entre períodos criativos, em que as sinapses lhe fazem explodir ideias, e períodos desconstrutivos em que tudo o que é, deixa de ser. Patrick (Jonathan Groff) é um teddy bear com ar ingénuo e quase desajeitado que trabalha numa empresa de jogos de vídeo e anda a tentar passar do limite dos cinco meses de relação. Dom, Augustin e Patrick são amigos, são homossexuais, vivem em São Francisco. Frango com Piri-Piri. Artista em busca de [inserir palavra]. Cinco meses de Relação. Querem algo mais vulgar do que isto?

De facto, um dos pontos positivos de Looking passa por não explorar os seus personagens principais do ponto de vista da sua homossexualidade, mas sim do ponto de vista das suas vidas, das suas dúvidas, dos seus medos e receios, alegrias e êxtases. O foco nas trivialidades humanas, ao invés de um show off sem nexo da comunidade gay (que foi eficazmente evitado), permite ao espectador encontrar algo de si próprio em cada personagem. Empatizar. Rever-se.

Além disso, a série mantém um tom singularmente cómico, ainda que o contexto seja de drama a maior parte do tempo. Jonathan Groff contribui largamente para este ambiente dualista, encenando um sorriso, também este dicotómico, que vai do sarcasmo à ingenuidade, do controlo à submissão, da ética à imoralidade. Groff oferece uma performance mais do que adequada e desenvolve o seu personagem com uma naturalidade que dá prazer acompanhar. Murray Bartlett interpreta Dom de forma inteligente, conseguindo transmitir a gravidade e compostura necessárias para compreendermos o personagem. Em segundo plano ficam talvez Alvarez e Lauren Weedman (Doris, companheira de casa de Dom), embora também ofereçam boas prestações.

No fundo, para aqueles que não se ficarem pelos primeiros episódios, Looking vai revelar-se uma série interessante que vai para além daquilo que é esperado. Dizer que esta série tem sexualidade gratuita, não é verdade. Talvez seja uma afirmação que possa fazer sentido aos menos atentos, mas nunca àqueles que gostam de ler nas entrelinhas. A verdade é que, em Looking, cenas eróticas não são assim tantas e, quando aparecem, não são nada imaturas e desprovidas de significado. Recordo uma cena que me despertou especial interesse em que Augustin decide fotografar o seu próprio namorado, Frank, a ter relações com um acompanhante – Art for art’s sake!.Aos mais distraídos, a cena poderá ser interpretada como um exemplo do estereótipo de promiscuidade associado à homossexualidade. No entanto, é precisamente esse estereótipo que a cena está a pôr em causa, já que os mais atentos hão de reparar que Augustin acaba por se sentir desconfortável ao longo de toda a cena. Vulgarmente desconfortável, tal como qualquer outra pessoa se sentiria.

Looking é uma garrafinha flutuante cheia de mensagens que dá espaço aos personagens para se desenvolverem e crescerem em direção a si próprios e aos outros, deixando de parte os egocentrismos e as histerias inerentes à aventura de se ser jovem e estar no mundo. Filmada de uma forma aparentemente muito natural, a série dá-nos também uma visão diferente da cidade São Francisco nos dias de hoje e, sem dúvida, uma perspetiva inteligente sobre a comunidade homossexual contemporânea, ainda que nem sempre fuja ao cliché – não nos escapámos de uma parada gay com direito a exibição de roupas de cabedal.

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