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O Jogo da Imitação (The Imitation Game, 2014)

Vamos pôr de parte a guerra mundial, aliados e nazis, genocídio, direitos humanos e até mesmo o legado científico de Alan Turing. São temas de extrema importância mas este filme não é sobre nada disto. Por mais improvável que soe, The Imitation Game é um filme de amor.

Não, não é aquele amor do tipo perdidamente-apaixonados-Romeu-e-Julieta-amor-à-primeira-vista-e-resistente-a-todos-os-obstáculos. É um amor muito mais triste, solitário e real.

The Imitation Game é a história comovente de Alan Turing, um génio da criptoanálise, pioneiro na ciência da computação e principal responsável pela criação do melhor amigo do homem no séc. XXI (o computador que têm em frente aos olhos, para quem não adivinhou logo o que era). Mas mais do que isso, o Alan Turing deste filme é um rapaz solitário que não conseguia relacionar-se com o mundo.

Os esforços para decifrar os criptogramas da (super)máquina Enigma estabelecem um paralelo com os esforços do rapaz incompreendido e rejeitado pelos colegas para decifrar os códigos da sociedade. A máquina de Turing, mais do que o contra-ataque dos Aliados, é a ponte que o liga à humanidade – como se o mundo inteiro falasse em código e ele fosse o único sem a chave para descodificar as mensagens escondidas por trás de um convite que tem de ser deduzido, uma pergunta que não pergunta nada ou um olhar que tanto pode querer dizer «Deixa-me em paz» como «Vem falar comigo».

The Imitation Game conta a história de um rapaz que queria ser amado, que queria compreender e ser compreendido, que queria pertencer – mesmo que isso significasse criar o seu próprio lugar no mundo.

Benedict Cumberbatch está em todo o lado ultimamente e assim deve continuar até, pelo menos, 2016. No entanto, o que nos faria odiar a maior parte dos atores, não o torna nem um pouco insuportável. Porquê? O charme britânico há-de ter uma perninha no assunto mas a principal razão é porque o homem sabe o que faz.

Uma personagem que corria o risco de ser um pouco demasiado parecida com o Sherlock Holmes que despertou as atenções sobre Cumberbatch (já que partilham o mesmo arquétipo do génio insociável), é tratada de foma bastante diferente, tornando claras as suas intenção e emoção únicas e uma personalidade própria apesar das similaridades. O Turing de Cumberbatch tem uma aura e atitude distantes, um tanto inalcançáveis (tal como Sherlock Holmes), mas ainda assim capazes de provocar empatia e compaixão; é como um miúdo estupidamente perspicaz e inteligente que não deixa de ser um miúdo, com toda a inocência e desamparo que a designação acarreta.

Por falar em miúdos, Alex Lawther, que interpreta o jovem Alan Turing, também merece atenção. Com a pouca experiência que tem, consegue facilmente estar ao mesmo nível, às vezes quase ultrapassar, o resto do elenco.

Só Keira Knightley desperta uma leve irritação. A atriz é brilhante a interpretar Joan Clarke, colega e noiva de Turing; é a atriz secundária perfeita que faz exatamente aquilo que uma atriz secundária deve fazer: suportar o protagonista. Knightley consegue ser engraçada, carismática e romântica sem roubar protagonismo, dramática sem descontar na plausibilidade e vice-versa. Não há literalmente nada negativo que lhe possa ser apontado. O que obviamente nos leva a perguntar: o que raio foi aquilo em Laggies?!

Além de um elenco sem falhas, o filme também ganha por ter um guião espetacularmente escrito, que consegue intercalar diferentes etapas da vida de Turing sem perder fio à meada, mantendo a lógica de uma história com príncipio, fim e cenas memoráveis pelo meio.

The Imitation Game é um filme completo – boa história, bom realizador, bons atores, excelente atriz secundária – que só perde por nem sempre discernir corretamente o que é pertinente ou não, com algumas cenas e diálogos que não acrescentam nada além de tempo à película de quase duas horas.

Colherada Final

Veredito

Sometimes it's the people no one imagines anything of that do the things that no one imagines. E às vezes são os filmes pelos quais não damos grande coisa, que parecem repetitivos ou pouco originais, que mais nos surpreendem.

8/10